caderno c, de goya

aos títulos originais dos desenhos (aqui, listados na ordem usada pelo Museu do Prado), se segue a tradução/versão que fiz para ASMA.

C1: Por no trabajar
Vashti: “Por me recusar a realizar trabalhos degradantes?”

C85: Por haber nacido en otra parte
Vashti: “Por ser estrangeira?”

C86: Por traer cañutos de Diablos de Bayona
Este título alude às publicações francesas que advogavam contra a intolerância e a tirania dos reis. “Proibidas na Espanha, elas eram introduzidas clandestinamente em forma de canudo via Bayona, cidade do Sul da França na fronteira com a Espanha (não confundir com a Baiona da Galícia). Já em 1792-1793 a cidade era o centro da propaganda revolucionária. Posteriormente, a partir de 1814, se iniciou uma corrente parecida, contra o absolutismo de Fernando VII”. O historiador Pierre Gassier considera que o condenado do desenho suporta uma pena de infâmia, seguida por uma pena de desterro, fazendo desse desenho especialmente importante para ASMA. Fonte: Fundação Goya em Aragon.

C87: Le pusieron mordaza por que hablaba. Y le dieron palos en la cara. Yo la bi en Zaragoza à Orosia Moreno Por que sabia hacer Ratones
Vashti: “Por ter o nome que tenho e fazer o que faço?”

“No domingo, 26 de outubro de 1760, Goya, então com 14 anos, testemunha um auto de fé que acontece na igreja de San Pablo em Saragoça. A vítima, natural de Jaca (Huesca), solteira, 30 anos, chama-se Orosia Moreno. Francisco de Goya sugere que a mulher no cadafalso, sentada em posição inclinada para a esquerda, com os membros amarrados, segurando uma vela apagada nas mãos, o cabelo curto e uma coroa na cabeça, na qual aparecem chamas e demônios, é acusada de infectar casas com pragas de roedores. Orosia foi condenada a duzentas chicotadas nas ruas públicas e a ser confinada em um hospital da cidade por toda a vida”. Fonte: “Memoria y presente en Goya: El Auto de fe de Orosia Moreno nn 1760 y el Álbum”, C. Francisco J. R. Chaparro, New York University, Institute Of Fine Arts.

C88: Pr linage de ebreos
“Figuras condenadas em trajes penitenciais (sanbenito e corozas) saem de uma prisão e se enfileiram entre um padre visto por trás e um oficial da Inquisição. A tragédia da cena é sublinhada pela primeira figura apertando as mãos em angústia, a cabeça baixa de vergonha. Através deste desenho, Goya faz a pergunta, por que eles estão lá, e sua inscrição fornece a resposta ‘por ser judeu’. O desenho se destaca dos outros em Álbum C, porque mostra um grupo de pessoas, enquanto outras páginas retratam indivíduos sozinhos em seu sofrimento. A presença de seus algozes serve para aumentar a solidão do condenado, expressando poderosamente seu destino”. Fonte: Museu Britânico.

C89: Por mober la lengua de otro modo
Vashti: “Por ter outra língua materna?”

“O protagonista masculino foi condenado ‘por mover a língua de outra maneira’, talvez por rezar em uma língua diferente – em hebraico – embora também possa ser por expressar ideias contrárias à doutrina oficial. Como é comum em sua série gráfica, Goya liga diferentes obras através dos títulos e, assim, a série começou com uma mulher condenada por ter nascido em outro lugar, e executada por motivos ligados à heterodoxia, seja religiosa ou de pensamento. Com o objetivo de aumentar o valor semântico da composição, Goya coloca uma série de inscrições no sanbenito, que aludem de forma simbólica ao motivo de sua execução, enquanto na coroza mantém as chamas típicas do grau máximo da pena (a fogueira). Com este recurso gráfico Goya alude à necessidade de abordar o excesso penal”. Fonte: Museu do Prado.

C90: Por no tener piernas – yo lo conoci á este baldado q.e no tenia pies / y di[c]en qe le pedia limosna al correo # / # cuando salia de Zaragoza / y en la calle de / Alcala cuando entraba lo encontraba pidiéndole
Vashti: “Por ser perneta?”

Atenção: ASMA contem passagens violentas e terminologias politicamente incorretas, como é o caso de “perneta”. O uso desses termos corresponde à forma como se falava sobre minorias sociais, no tempo vivido pela personagem (550 a.C). Autora e editores não endossam o uso desses termos entre pessoas reais, no século 21. Para um letramento em linguagem inclusiva, favor visitar https://www12.senado.leg.br/manualdecomunicacao/estilos/linguagem-inclusiva.

Conforme indico na nota introdutória de ASMA, “Usei, em alguns poemas, termos que evocam alguns preconceitos – infelizmente, no mundo pelo qual andamos (e pelo qual anda Vashti) as palavras foram e são usadas como instrumento de opressão. Não poderia construir essa história fingindo que as palavras não são ferramentas a serviço de violência (e de resistência!) porque elas integram, ainda que à nossa revelia, a trajetória dos seres femininos (e de outros grupos) ao longo da história”.

C91: Muchos an acabado asi

C92: Por querer á una burra

C93: Por casarse con quien quiso
Vashti: “Por amar quem amava?”

C94: Por descubrir el mobimiento de la tierra
Vashti: “Por saber que a Terra é redonda?”

C95: No lo saben todos

C96: No haver escrito para tontos
Vashti: “Por escrever para mudar o mundo?”

C97: Te comformas?

C98: Por Liberal?
Vashti: “Por respeitar a constituição?”

Aqui “liberal” significa não a doutrina como a compreendemos hoje, mas sim constitucionalistas e antiabsolutistas da época.

C99: Cayo en la trampa

C100: No comas celebre Torregiano
“Se refere ao escultor florentino Pietro Torrigiano. Segundo informações de Giorgio Vasari, o Duque de Arco teria encomendado a Torrigiano uma escultura da Virgem, que Torrigiano esculpiu mas o duque não pagou. Revoltado com o calote, Torrigiano destruiu a escultura, motivo pelo que foi julgado e preso pelo Santo Ofício em 1522. Segundo o historiador, Torrigiano teria morrido depois fazer greve de fome numa prisão sevilhana, versão contestada por outros pesquisadores”. Fonte: Museu do Prado.

C101: No se puede mirar

C102: Pocas óras te faltan

C103: Mejor es morir
“A preocupação com os abusos de autoridade é uma constante na obra de Goya desde os anos 1790. Se este tema é excepcional no cenário artístico espanhol de seu tempo, é, no entanto, um dos aspectos jurídicos mais importantes do final do século 18 e início do 19. De fato, o livro Dos delitos e das penas, de Cesare Beccaria, publicado originalmente em italiano em 1764 e traduzido para o espanhol dez anos depois, constitui um texto programático da necessidade de reformar a forma de imposição de penas visando um tratamento mais humano ao preso [uma citação de Beccaria encerra o capítulo um de ASMA]. Sob essa abordagem, Beccaria proporá a abolição da crueldade na punição, tortura e pena de morte e a necessidade de punição imediata. A influência do jurista e filósofo italiano na Espanha será refletida depois, já a nível prático, nas reformas legais das Cortes de Cádiz e a nova Constituição. É nesse ambiente que devemos compreender a preocupação de Goya em mostrar a crueldade no tratamento dos presos, protagonistas de boa parte dos desenhos do Álbum C. As condições desumanas de seu cativeiro e a postura do preso é reveladora do desânimo que o abate e que leva tanto ele quanto o observador – no caso, Goya – a intitular a situação com a lacônica frase ‘melhor é morrer’”. Fonte: Museu do Prado.

Tudo isso faz de Goya uma inspiração central para ASMA, sobretudo no capítulo dois.

C104: Muchas Viudas an llorado como tu

C105: Quien lo puede pensar!

C106: No habras los ójos

C107: El tiempo hablará

C108: Que crueldad

C109: Zapata tu gloria será eterna

C110: não encontrei :/

C111: No te aflijas

C112: Dispierta ynocente

C113: Ya bas á salir de penas

C114: Pronto seras libre

C115: Divina Libertad
“No final do Álbum C, vários desenhos celebram a restauração da Constituição e da liberdade na Espanha, com os títulos: Divina Libertad, Dure la alegria e LUX EX TENEBRIS. No C115 em particular, a presença do tinteiro e do papel à esquerda do personagem foi interpretada como evidência de liberdade de expressão. Vários autores situam este conjunto de quatro desenhos no contexto histórico da recuperação das liberdades após o levante de Rafael Riego em Cabezas de San Juan, em 1820, dando início ao Triênio Liberal. Outros pesquisadores colocaram essas imagens no âmbito da Constituição de 1812, após o decreto de liberdade de imprensa de 1810. (…) A personagem deste desenho recebe com alegria a Liberdade. A seus pés, um tinteiro e uma folha de papel meio escrita aludem à liberdade de imprensa que os tribunais de Cádiz promoveram em 1810”. Fonte: Museu do Prado.